O fim de coisa nenhuma

31 agosto, 2011

"(...) mares de trampa para apanhar um, dois peixes" - Jorge, Lídia. "Combateremos a Sombra", 2ª Edição, Dom Quixote, 2007.

O último dia de agosto acontece sereno. Sem se fazer notar. Não fosse o calendário seria um dia outonal perfeito. Faz um pouco de frio já. As roupas curtas parecem já meio ridículas. Os chinelos estão prontos a ser arrumados e esquecidos no armário. O verão vai embora e leva com ele "mares de trampa" que tive de navegar. Trampa daqui, trampa dali, trampa de ti e trampa dele, trampa de todos e trampa de ninguém.

Foi um verão de dor e de saudade, de incómodo com a vida bucólica que cheguei a pensar que era brilhante e perfeitamente citadina. A dor sempre está comigo como amiga maldosa de muitos anos que não conseguimos perder o contacto. A saudade é a penetra que espreita sempre por cada buraco que encontra. Tenho dor não sei de onde, tenho saudade de não sei o quê.

Vou-me embora. Vou-me embora. Vou-me embora.

E sinto-me doente, como se carregasse um cancro para o qual não há quimioterapia, porque não há como lutar. Sinto um bicho cá dentro, devorando as minhas emoções e o meu tempo, um bicho cá dentro com fome de mim, com fome de tudo o que tenho, um bicho que nunca dorme, um bicho que não me dá paz, um bicho tão presente como o ar que respiro e tão palpável como a minha barriga exagerada.

Descansar. O que é descansar?
Dormir. O que é dormir?

Apenas intervalos na trampa. Apenas meras interrupções do nada que não levam a nada nem trazem nada.

E mesmo assim, a minha dor não é solitária. O início de setembro trouxe para alguns a sombra do desemprego, da incerteza. Da obrigação de ficar aqui e não ir para Lisboa e esperar um ano para uma nova tentativa.

Estou melhor do que isso. Mas não estarei à mesma doente? Um bicho que devora, uma amiga maldosa acompanhada de outra e mares de trampa, mares de trampa para apanhar um, dois peixes.

Se calhar o problema é meu

29 agosto, 2011

Mas sinto-me desapontado com as minhas pessoas. Falámos de um verão que não era este, um verão em que íamos estar juntos, que íamos ter aventuras e estar juntos. Ilusões - Ilusões de quem está longe e que quer acreditar que ainda tem uma casa. Este sítio já não me pertence mesmo, aqui não consigo - e talvez nem queira ser feliz.
Estado de vagabundo constante tendo ou não casa. Sinto-me mais perdido que nunca, mas encontrei um pouco de mim no meu desencontro.
Levo para Milão quase a certeza de que a ilusão do "vamos estar juntos depois" não se concretiza - é só promessa piedosa.
Estou farto de quem não se esforça para estar comigo quando eu toda a vida ando a tentar. Mas eu não posso mais andar atrás de quem foge de mim. Estou cansado. Ninguém parece perceber que me vou mesmo embora e que me vai custar. Ninguém quer saber. Este Algarve mata-me todos os anos.

De qualquer forma, também pode ser que isto seja tudo criado por mim. Em todos os verões chega uma altura, em que eu já farto de tudo e todos, fico rabugento, parvo e em agonia por falta de acção. Mas que merda é esta de vida? Não estou a perceber a minha existência neste momento. Sinto-me sem propósito, a viver por vício e não por vontade. Sinto, talvez de uma forma meio egoísta que ninguém espera sentir a minha falta. Talvez eu não seja assim tão importante. Andei iludido, e a desilusão está me a matar. Ninguém pode vir, ninguém quer vir. É a maior merda. Sinto-me abandonado. Realmente abandonado por aqueles que amo.

Será que afinal a minha vida não mudou nada? Bolas, será que continuo o mesmo? É melhor nem pensar. Ainda pensei: Não, eles só podem estar a gozar. Eles vão me fazer uma surpresa e aparecem cá todos. Mas...não me cheira. Não me cheira que se organizassem tão bem para fazer isso. Não me cheira que eles sequer se importem. Não sei. Não quero parecer injusto, mas merda.

Talvez Milão me vá dar duas ou três coisinhas que sempre precisei, mas é bom eu estar ciente que eu não vou mudar por estar lá. Se calhar vou me sentir tão inútil ou gordo ou feio como de costume. E pensar que em Lisboa ainda gostei do meu corpo... Não sei.
Estou a precisar de voltar para um tipo qualquer de terapia. Tenho saudades das minhas sessões com a Paula e sinto que ando quase tão perdido como antes (...)
Se calhar é esta vivência com os meus pais que me mata.
Estou tão farto de tudo...

O senhor Alexandre

25 agosto, 2011

Não era um homem mau. Dava sempre comida aos pombos e aos gatos. Quando espirrava, limpava o nariz com lenços antigos mas muito finos que tinham sido da mulher. Era simpático e jogava na batota com os amigos enquanto bebia um copo. Lia o jornal todos os dias. Falava dos políticos com o Senhor Pedro que estava surdo mas que acenava sempre como se compreendesse todas as coisas do mundo. Quando ia ao mini-mercado elogiava sempre o cabelo da Dona Eulália, uma senhora gorduxa e vestida com um bata surrada.

De vez falava com o filho que estava nas Américas e era sempre simpático. O filho tinha ido novo e nunca mais tinha voltado e há alguns anos atrás tinha mandado uma fotografia do casamento e da primeira filha que o Senhor Alexandre nunca tinha conhecido mas que amava profundamente com todas as forças que tinha.

Mas tinha um problema. Sempre que alguém lhe perguntava indicações, respondia tudo errado. Mandava as pessoas rua acima quando era suposto descerem e mandava-as para a direita quando era suposto virarem à esquerda. Dizia sempre que o autocarro não parava na paragem que lhe perguntavam e chegava a inventar números de autocarros que não existiam. Dizia sempre tudo mal mas não era um mau homem.

Para ele, se as pessoas fossem sempre dar ao sítio certo da vida acabavam por perder a maior aventura de todas: viver. Cometer erros. Ficar para trás à espera de autocarros fantasma. Perder-se numa cidade estranha sem saber falar a língua. Para ele, errar algumas vezes era melhor que acertar sempre e "nos caminhos em que não é suposto andarmos é que acabamos por nos encontrar" dizia ele.

"Sorry. Onde é o Marquêsh de Pomball?
"Sempre em diante, sempre em diante. Não pare."

O destino é assim mesmo. Nem sempre nos leva para onde queremos mas acaba sempre por nos levar ao sítio certo. E continuava o seu caminho para ir jogar à batota com os amigos, beber um copo e falar como Senhor Pedro.

Verão Sem Sal III

O que me realmente anda a estragar o Verão é ver putos da minha idade com carro novo e carta, que tiraram tudo em 3 dias enquanto eu ainda ando por aqui a tentar acabar o código.
O que me realmente anda a estragar o Verão é ter que aguentar toda a gente a dizer "vais-te embora durante um ano" e ter que consolar toda a gente e apoiar toda a gente e dizer que vai ser rápido quando eu é que vou ficar lá sozinho à sorte, sem destino.
O que me realmente anda a estragar o Verão é ter aulas de italiano e sentir que não estou a avançar nem um bocadinho e que saio de Portugal a saber o mesmo.
O que me realmente anda a estragar o Verão é o meu pai estar constantemente a falar de dinheiro, viagens e empréstimos e nunca ouvir o que eu tenho para lhe dizer.
O que me realmente anda a estragar o Verão é a minha mãe e as suas manias de poupanças e de espíritos e maus destinos e más vidas.
O que me realmente anda a estragar o Verão é o meu pai nunca me ouvir.
O que me realmente anda a estragar o Verão é ter que tratar ainda de 50 coisas em relação à minha antiga morada e descobrir o que fazer a tudo o que é meu e como transportar todas essas coisas.
O que me realmente anda a estragar o Verão é pensar que o meu último tinha sido exactamente a mesma coisa mas que eu era mais jovem, menos consciente e pensava que tinha todo o tempo do mundo. Guess what, you don't.
O que me realmente anda a estragar o Verão é ter imensas pessoas interessantes à minha volta e sentir-me sozinho.
O que me realmente anda a estragar o Verão é ir para uma festa de despedida quando eu já me despedi de tudo aqui há imenso tempo.
O que me realmente anda a estragar o Verão é pensar como de raio vou ficar em lisboa no último fim de semana antes de me ir embora.
O que me realmente anda a estragar o Verão é pensar que não fiz metade do que queria, não perdi nem um kilo, não escrevi metade do livro que ando a pensar e de que gosto realmente, como não gostava há tempos.
O que me realmente anda a estragar o Verão é esta sensação de stress constante sobre pequenos nadas que doem como diria o meu amigo Fernandinho.
O que me realmente anda a estragar o Verão é não ter feito nenhuma viagem e ter ficado aqui o tempo todo a olhar para o nada.
O que me realmente anda a estragar o Verão é tudo, todos, esta cidade e a mais próxima e o facto de pensar que vou morrer de saudades de tudo isto e vou chorar como se não houvesse amanhã.
O que me realmente anda a estragar o Verão é pensar. Pensar nisto, naquele, naquela, no outro e no fulano tal.
PENSAR MATA.

Hoje pensei no tempo

22 agosto, 2011

E como anda sem parar. Estive com uma amiga da Pinheiro, uma que foi embora quando entrei no 12º ano. Não sei se alguma vez falei dela aqui. Ela foi a minha primeira amizade na secundária. Era gira, com um aspecto alternativo e conhecia Everwood e, tal como eu, adorava.
Foi ela que me levou para o Clube de Astronomia, um espaço para pessoas diferentes. Eu nunca consegui ser tão diferente como eles, mas encontrei um espaço seguro onde pelo menos ninguém era extremamente desagradável para mim e onde eu conheci aquilo que se podia chamar de "amizade".
Era bonito e acolhedor ter uma sala ali na escola onde nos podíamos refugiar do mundo e onde, sentados em puffs e cadeiras de sala, o tempo parecia andar mais depressa nos intervalos.
(...)
Dois anos depois ela é estudante de medicina, vai para o 3º ano. Tem carro, namorado, fala sobre o que é fazer uma autópsia e de como a maior parte das pessoas em Medicina sofre dum Complexo de Deus desmesurado e ridículo. Está diferente. Mais crescida. Mais mulher. As feições tornaram-me menos pueris mas aquele sorriso simpático e aberto a qualquer um continua ali. Hei-de pensar sempre nela como uma espécie de médica fraternal - ela curou-me quando ninguém via que eu estava doente.
Não sinto saudades desses tempos porque o mundo não era o melhor sítio para mim e sofri bastante. Mas...pelo menos conheci pessoas como ela.
Por um lado, parece que passou muito depressa.
Por outro, foi como se tivesse vivido uma vida inteira do último dia em que a vi até hoje.

Verão Sem Sal II

21 agosto, 2011

Éramos um todo, um conjunto. Éramos como uma mesa de jantar. Havia copos, talheres, pratos, guardanapos, mesa, cadeiras e comida. E tudo corria bem, porque tudo funcionava
em harmonia.
Depois, o tempo passou.
Os copos que erguiam o vinho do nosso sangue partiram-se.
Os talheres que cortavam o pão dos nossos corpos enferrujaram.
Os pratos que passávamos uns aos outros ficaram despedaçados pelo tempo.
Os guardanapos que limpavam os nossos pecados foram comidos pelos bichos.
A mesa que suportava tudo encheu-se cupim.
As cadeiras que nos aguentavam a vida ficaram mancas.
A comida que alimentava a alma apodreceu.
E nada voltaria a ser igual porque é impossível fazer uma mesa de jantar só com pratos e guardanapos. E nunca nada poderia substituir aquilo que tinha sido aquela mesa.
É impossível fazer o tempo voltar a atrás.
As fotografias de um tempo imaculado, mantêm ainda nas paredes como memórias de outra realidade. Ainda dói. Afinal ainda dói.
E ainda vai sangrar mais antes de cicatrizar.

Verão Sem Sal

19 agosto, 2011

O meu verão ainda de dieta. Sem amigos, sem saídas, sem nada.
E eu cansado de escrever.

Quando eu olho no espelho, será o meu reflexo uma ilusão?

13 agosto, 2011

Uma ilusão criada por mim dum homem que nunca fui?
Eu sei quem sou para mim. Mas o que serei para os outros?

Lisbon Revisited

12 agosto, 2011


Nada me prende a nada.

Quero cinquenta coisas ao mesmo tempo.

Anseio com uma angústia de fome de carne

O que não sei que seja —

Definidamente pelo indefinido...

Durmo irrequieto, e vivo num sonhar irrequieto

De quem dorme irrequieto, metade a sonhar.

Fecharam-me todas as portas abstractas e necessárias.

Correram cortinas de todas as hipóteses que eu poderia ver na rua.

Não há na travessa achada número de porta que me deram.

Acordei para a mesma vida para que tinha adormecido.

Até os meus exércitos sonhados sofreram derrota.

Até os meus sonhos se sentiram falsos ao serem sonhados.

Até a vida só desejada me farta — até essa vida...

Compreendo a intervalos desconexos;

Escrevo por lapsos de cansaço;

E um tédio que é até do tédio arroja-me à praia.

Não sei que destino ou futuro compete à minha angústia sem leme;

Não sei que ilhas do Sul impossível aguardam-me náufrago;

Ou que palmares de literatura me darão ao menos um verso.

Não, não sei isto, nem outra coisa, nem coisa nenhuma...

E, no fundo do meu espírito, onde sonho o que sonhei,

Nos campos últimos da alma onde memoro sem causa

(E o passado é uma névoa natural de lágrimas falsas),

Nas estradas e atalhos das florestas longínquas

Onde supus o meu ser,

Fogem desmantelados, últimos restos

Da ilusão final,

Os meus exércitos sonhados, derrotados sem ter sido,

As minhas coortes por existir, esfaceladas em Deus.

Outra vez te revejo,

Cidade da minha infância pavorosamente perdida...

Cidade triste e alegre, outra vez sonho aqui...

Eu? Mas sou eu o mesmo que aqui vivi, e aqui voltei,

E aqui tornei a voltar, e a voltar,

E aqui de novo tornei a voltar?

Ou somos todos os Eu que estive aqui ou estiveram,

Uma série de contas-entes ligadas por um fio-memória,

Uma série de sonhos de mim de alguém de fora de mim?

Outra vez te revejo,

Com o coração mais longínquo, a alma menos minha.

Outra vez te revejo — Lisboa e Tejo e tudo —,

Transeunte inútil de ti e de mim,

Estrangeiro aqui como em toda a parte,

Casual na vida como na alma,

Fantasma a errar em salas de recordações,

Ao ruído dos ratos e das tábuas que rangem

No castelo maldito de ter que viver...

Outra vez te revejo,

Sombra que passa através de sombras, e brilha

Um momento a uma luz fúnebre desconhecida,

E entra na noite como um rastro de barco se perde

Na água que deixa de se ouvir...

Outra vez te revejo,

Mas, ai, a mim não me revejo!

Partiu-se o espelho mágico em que me revia idêntico,

E em cada fragmento fatídico vejo só um bocado de mim —

Um bocado de ti e de mim!...


Fernando Pessoa

"Nothing tastes as good as skinny feels"

09 agosto, 2011

"In the 21st century, thin equals success: posh clothes shops don’t make big sizes; rich footballers marry skinny birds. And fat is no longer just a feminine issue."
Mills, Eleanor - The Sunday Times, 22 de Novembro de 2009, Londres.

E eu estava tão feliz hoje.
(...)

Acabei de perceber agora que não falei dos meus anos

07 agosto, 2011

E isso é perturbador. Porque os meus anos eram sempre qualquer coisa que gostava de assinalar no blogue. Bem, 19 anos é o medo absoluto, parece ridículo eu já ter 19 anos se ainda me lembro de andar no infantário...
O meu dia de anos foi excelente. Passei na concentração, com o gang do costume. Foi engraçado.
Para o ano há mais!

Wonder

Todos os dias me cresce a ansiedade do meu programa Erasmus. Eu não consigo parar de falar sobre isso, parar de pensar nisso, em parte porque toda a gente à minha volta anda louca com o assunto. Pelo menos, os meus pais andam - e eu não tinha visto o meu pai tão preocupado com o assunto Lisboa como está com o assunto Milão. A minha continua a mesma neurótica de sempre, sempre a deixar pistas e bocas no ar que devia desistir, devia tentar outra coisa, devia ter cuidado, que não sei onde me estou a meter, que não falo a língua, etc...

Mas eu estou tão desejoso de conhecer outro mundo, outro país, outras pessoas. Quem sabe encontrar alguém especial. Não vou ser tonto e dizer que vou em busca da minha cara-metade, de uma aventura romântica, (de uma história como a da minha amiga poeta, mas porque é que isso não há de acontecer? E os amigos que vou fazer? E os lugares que vou conhecer? A rotina que vou criar...Parece-me tudo um mar enorme de possibilidades, de escolhas, quase como um novo começo em que realmente vou definir quem sou, longe daquelas coisas que sempre disse que diminuíam. Longe de Sacavém e da desculpa que a amizade era caótica e que não tínhamos experiência, longe dos dramas da minha faculdade em que tudo tinha que ser de uma certa forma, mais longe ainda da minha mãe e do meu pai que de alguma forma realmente moldam a maneira como sou, longe dos meus amigos e dos seus olhares que também me guiam de alguma maneira. Se calhar vou ser exactamente igual, se calhar não. Quem sabe? O facto de não ter nada escrito, nem planeado, assusta-me tanto como a possibilidade de encontrar um fantasma na casa de banho, mas é tão entusiasmante não saber o dia de amanhã.

E as roupas? E os sapatos? E aquele lado da moda que TODA a gente fala de Milão? Não sei se vou mudar de estilo completamente, como aqueles sonhos em que tinha quando era mais novo e achava que um dia ia ser "super cool com calções fixes e t shirts da cena", mas hei de mudar um bocadinho bolas.

Nem tudo são rosas na realidade. E o dinheiro para fazer esta andança toda? E se por acaso correr tudo mal? E se tudo for a maior merda? E se assim que chegar lá, tiver vontade de voltar? Não quero voltar, como tantos casos que conheço, amargurado com a vida e as pessoas. Não quero voltar sem esperança e fé no mundo. Quero ir um rapazinho e voltar mais ou menos um homem. Mesmo que ainda não faça a barba de uma maneira decente. Quero vir diferente. Quero muito. Quero vencer muita coisa em mim que precisa de ser vencida. E quero sentir-me bem. Quero desesperadamente sentir-me bem como sou, como me visto, como falo. Quero exorcizar alguns fantasmas. Pode ser?

Entretanto, embora a aventura comece em Setembro as coisas por aqui não param. Voltou o drama do Código, da Carta e dessa merda toda que se eu soubesse...se eu soubesse nunca me teria metido nisso tão cedo. Cabe-me agora marcar o código, passar no teste e esperar pelo exame de condução. Não sei o que vou sentir quando tirar a carta mas aposto que vai ser qualquer coisa com um grande dia em que um bocadinho do sofrimento que carrego todos os dias vai acabar.

Além disso, os meus amigos também estão diferentes. Evoluímos tanto como pessoas que é difícil pensar nos dramas e nas situações que aconteceram há alguns anos atrás. Mantemos a mesma essência. Os meus momentos com a Carla, com o Ricardo, com a Joana, a Maria não se destingem entre si - porque aquela amizade fresca de todos os dias mantêm-se, aquela conversa acelerada, aquele riso incontrolável, aqueles momentos de pura brincadeira...Tudo isso ficou mais ou menos igual. Mas hoje, somos pessoas com cicatrizes diferentes e de dantes falávamos no caminho, agora estamos a percorre-lo, cada um da maneira que melhor entende. Para mim, percorrer o caminho significa ir embora, andar por aqui e por ali a navegar. Para eles o caminho é diferente mas não menos desafiante ou inspirador. Cheguei mesmo a pensar que ficar aqui seria um desperdício de vida, de tempo...Mas o que eu precisei para mim, pode ser inútil ou até destrutivo para os outros e hoje, algum tempo passado, acho que tudo aconteceu pelo melhor.

Não sei até que ponto é infantil dizer que as coisas estão diferentes. Neste blogue, podem me apanhar em diversos momentos a dizer "estou diferente, as coisas estão diferentes, eles estão diferentes". Mas isso continua a ser verdade. A vida tem estes ciclos engraçados que duram um certo tempo e depois mudam-nos completamente. Acho que entrar na vida adulta deve ser qualquer coisa como tornar esses ciclos maiores. Talvez em anos, ou décadas. Na adolescência, esses ciclos vêm às semanas, claramente. E esta é outra coisa que costumo dizer com frequência, mas gosto honestamente de ter espaço que marca tudo o que aconteceu.

Sinto que há muito tempo que não escrevia assim. Tão diário, tão puro, tão completamente pessoal e íntimo. Mas fez-me bem. Estava a precisar dum momento assim, só eu e o meu blogue e as minhas coisas. Os meus devaneios quase poéticos mas ainda tão inocentes...

A minha única vontade agora é (e tenho a certeza que isto vai vir contra mim - mas porque raio é que isto tem que vir contra mim?) envelhecer um pouco. Envelhecer a minha feição tão criançola. Ter umas rugas de expressão. Ter uns pêlos a mais. Ter uma barba de que me orgulhe. Ter uns braços mais grossos. Um corpo mais masculino. Ser um bocadinho menos criança. Acho que sim. Acho que me faria bem.

Tive ali aquele momento do " tenho a certeza que isto vai vir contra mim", porque tive literalmente a ideia de estar mais velho e querer voltar a ser criança. Eu sei, vocês sabem e todo o mundo sabe que eu só gosto daquilo que não tenho. Mas honestamente. O momento é hoje. Tenho saudades de muitas coisas e muitas pessoas. Mas adoro viver o meu dia-a-dia. Adoro crescer mais do que nunca. Lido cada vez melhor com as separações. Ainda me dói o coração de pensar nisso, mas controlo melhor as minhas coisas. Aceito melhor as coisas. Enfim

Estou cansado já de escrever e quero dormir. Apetece-me abraçar-me e ficar comigo e ter um momento a dois: Eu e Eu - juntinhos numa cama a pensar, a ler ou simplesmente a sonhar. Nunca hei-de te deixar de sonhar, esteja muito crescido ou não.

Quilo a Quilo

03 agosto, 2011

Há alguns tempos que não tinha um dia tão agradável. Um tempo porreiro, um estado de espírito engraçado e uma ou duas surpresas.

Para começar, o meu pai trouxe-me, para grande espanto meu, uma bicicleta completamente arranjada e herdada dum amigo. Há muito tempo que queria voltar a andar de bicicleta, para dar as minhas voltas e fazer uma bocado de exercício. Mas entretanto, uma após outra foram roubadas e acabei por desistir de as ter. Agora, comprei um cadeado e ela vai andar sempre dentro do prédio. O raio que as parta - as velhas desgraçadas que se queixam de tudo e de nada.

E depois, agora como é hábito, fui-me pesar. Andava um bocado agoniado com o meu peso, acabei por engordar nas última semanas em Lisboa e cheguei a níveis onde nunca tinha chegado. Mas...há esperança. Perdi um Quilo e 100 gramas (Porque se no Peso Pesado as gramas contam, porque não hão de contar comigo) e isso alegra-me de uma maneira inacreditável. Pensar que ainda há volta a dar, que ainda posso diminuir o meu corpo e tentar ainda ser feliz...seria fantástico. Para já a minha meta real é voltar ao peso que tinha quando fui para Lisboa. O meu sonho mais fantástico é voltar aos 80...Quilo a Quilo.

Le Strange Summer

Há muito tempo que não acordava antes do meio-dia e há qualquer coisa que bate dentro de mim, em reconhecimento de um tempo que eu estava nesta casa a morar. Era um ritual das manhãs, acordar cedo, vestir-me, despachar-me como podia para ir para a secundária. Inacreditavelmente, o tempo passou. Há um ano que não estudo mais numa secundária e há um ano que não moro aqui.
Mas tudo está igual como sempre.

Talvez eu tenha sido o único a mudar. Ainda ontem me apanhei a dar conselhos a alguém que vai entrar na secundária pela primeira vez. Entrar no 10º ano, assim, completamente desprotegida e à espera do melhor. Eu só gostava de ter tido alguém que me tivesse dito o que eu lhe disse "Mesmo quando tudo parece que vai desabar, vai correr tudo bem". Quem me dera que alguém tivesse sido para mim, o amigo que eu fui para ela naquele instante.

De qualquer forma, esta casa cansa-me. Nem tudo são memórias felizes de um tem perfeito de aulas e "marotices". Esta casa assistiu aos meus melhores dias e aos meus piores e não consigo deixar de a querer abandonar. Para o raio vá o número 8 da Rua da Fábrica da Loiça. Eu já não pertenço aqui.

Enquanto isso, o Verão vai andando eu ainda não fui a uma única aula de código e a única certeza que carrego é não ter certeza nenhuma. "Vai correr tudo bem..."